7 de fevereiro de 2010

Entrevista com psicóloga escolar sobre a Síndrome de Asperger

Alunas Autoras: Patrícia Fonseca Alves e Rebecca mendes Ferreira

O termo “síndrome de Asperger” foi utilizado pela primeira vez por Lorna Wing em 1981, num jornal médico, que pretendia desta forma honrar Hans Asperger, um psiquiatra e pediatra austríaco que resolveu estudar o comportamento e habilidades que, como descreveu, ocorria preferencialmente em meninos; denominou-o de psicopatia autista, uma desordem da personalidade que incluía: falta de empatia, baixa capacidade de formar amizades, conversação unilateral, intenso foco em um assunto de interesse especial e movimentos descoordenados.

Essa Síndrome diferencia-se do autismo por não comportar necessariamente atraso ou retardo no desenvolvimento cognitivo ou da linguagem do indivíduo. Asperger chamava as crianças que estudou de pequenos professores, devido a sua habilidade de discorrer sobre um tema detalhadamente.

Conversamos com a psicóloga da escola inclusiva Creche Escola Casa da Tia Léa, Alice Damasceno, que trabalha com crianças portadoras dessa síndrome e esclarecemos e tiramos várias duvidas, a partir de exemplos concretos, acerca desse transtorno de desenvolvimento invasivo.

ALUNAS. Quais são as características da síndrome de Asperger?
A.D. A síndrome de Asperger é do espectro autismo, tido como o mais leve. A pessoa portadora tem um quadro de comprometimento menor, onde existe “alta funcionalidade”, ou seja, a criança responde bem às estimulações que lhes são feitas e mesmo apresentando uma dificuldade na interação e na comunicação, não são tão severas quanto o autismo. Diferente de outras síndromes que tem traços físicos bem demarcados, na síndrome de Asperger não há características físicas específicas.

ALUNAS. O que diferencia a síndrome de Asperger do Autismo?
A.D. No autismo há uma limitação maior na comunicação e na interação e, se observa movimentos estereotipados constantes. É como se o mundo não fosse interessante para a criança, ela não busca entendê-lo, interagir com ele na forma como nos disponibilizamos, a criança autista parece ter sua própria lógica, seu mundo particular.

No autismo, as crianças às vezes começam a falar cedinho, a balbuciar (‘ma ma’, ‘pa pa’), mas há um corte, e, quando ela retoma, faz repetições de palavras até mesmo pequenas frases, muitas vezes de forma descontextualizada com o ambiente em que está inserida. Com a estimulação adequada, essas falas começam a ser feitas com sentido e diálogos podem ser estabelecidos. Quanto mais interação, quanto mais estímulo de troca houver, mais a comunicação começa a exercer sua função social, de se fazer entender pelo outro e de conseguir o que ela quer nessa relação.
Eles podem ter, em termos de processamento sensorial, incomodo com o barulho, com som muito alto; interesse por objetos que giram, como ventilador, objetos que eles colocam girando.

Atualmente, alguns estudos trazem traços orgânicos para essa síndrome. São crianças que podem apresentar alguma falha neurológica, nos neurônios espelhos, que são neurônios que possibilitam a empatia, que fazem com que eu me interesse por você e você se interesse por mim. Não é mais como antigamente, quando o autismo restringia-se a relação mãe e filho. Hoje, levantam-se possibilidades, do orgânico a interação social.

Na síndrome de Asperger, observa-se uma dificuldade na fala e uma interação restrita com as pessoas, dificuldade em se colocar no lugar do outro, só compreendem uma a idade cronológica, mas outras não. Têm aí uma defasagem na simbologia, principalmente da leitura e da escrita que tem tudo a ver com o código lingüístico, que diz respeito a interação com o mundo em volta. Para algumas crianças, é mais difícil conseguir decodificar as letras e as palavras. A partir do momento em que se consegue interagir mais, ela fica mais presente na relação com o outro e evolui-se nesse aspecto cognitivo. Baixe aqui entrevista na íntegra em PDF.
ALUNAS. Como é feito o diagnóstico da síndrome de Asperger? Que características devem ser observadas pelo professor em sala de aula?
A.D. O diagnóstico desta síndrome é demorado, merece ser feito com muito critério e cuidado. Se considerarmos sua descoberta na década de 80, percebemos o quanto é novo, temos o que 30 anos? Na ciência é pouco tempo. Além da avaliação médica, a avaliação psicológica também é fundamental.

Eu, particularmente, não reverencio o diagnóstico, apesar de considerar sua importância. Creio que é fundamental para o professor em sala de aula conhecer seu aluno, quem é aquela criança que está diante dele. Aqui na escola, os professores conversam com todos os pais de seus alunos antes das aulas começarem. Com os alunos, o primeiro objetivo é interagir, conhecer, criar vínculos afetivos. E conhecer, significar olhar a criança, senti-la em sua inteireza, olhar além das limitações, das faltas, olhar o que lhe traz alegria, o que ela gosta de fazer, pelo que demonstra interesse, quais suas habilidades... olhar o ser humano. Todos nós temos pontos fortes e fragilidades.

O brincar diz muito. Quanto mais a criança brinca, troca com o outro, mais dentro do contexto ela está, mais envolvida no mundo e, o desenvolvimento dela possivelmente estará acontecendo dentro do esperado. Quanto menos interação, mais indícios, de que algo precisa ser cuidado. Nesses casos, fazem-se os encaminhamentos para os especialistas, não cabe a escola, o diagnóstico, nos cabe sim, buscar as estratégias educacionais que vão favorecer o desenvolvimento da criança na escola.

Nós temos, por exemplo, o caso de uma criança que recebeu o diagnóstico a partir de um encaminhamento da escola. Ela concluiu agora o infantil 5, apresentando um outro quadro, interagindo mais com as outras crianças, utilizando a fala de forma contextualizada, estabelecendo diálogos.

ALUNAS. O nível de comprometimento desta síndrome se trabalhado desde cedo, pode ser reduzido?
A.D. Temos observado que quanto mais cedo a intervenção adequada é realizada, a evolução é evidente. As crianças interagem mais, brincam, usufruem das atividades e de tudo que a escola pode proporcionar com mais leveza. As mudanças e as evoluções são possíveis a partir do momento em que se investem nelas, família, especialistas e escola.

ALUNAS. Quais os tipos de intervenções e métodos utilizados no acompanhamento de crianças que possuem a síndrome de Asperger?
A.D. Acredito que o sócio-interacionismo coloca-se como fundamento básico da prática educacional. O foco é a interação humana, é olhar no olho, é carinhosamente me por próximo ao outro, fazer-me presente, demonstrar interesse pelo que ele faz, pelo que diz, mostrar aos poucos, que a criança faz parte daquele grupo, inseri-lo devagar na rotina e atividades, valorizar suas conquistas, adaptar o que for necessário para favorecer sua inserção no que está sendo trabalhado em sala. Fazer parcerias com a família e os especialistas, também é essencial.

ALUNAS. Quais os profissionais que acompanham essas crianças?
A.D. Geralmente, uma equipe multidisciplinar, neurologista ou psiquiatra, psicólogo, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo, dependendo de como está à criança. O psicólogo é básico, por contribuir para estruturação de um sujeito que tenha uma maior noção de si e de suas relações no mundo, aprendendo a conviver com seus potenciais e limitações. Também no apoio e na orientação aos familiares.

ALUNAS. No tratamento dessas crianças é utilizado algum tipo de medicamento?
A.D. Não é utilizado nenhum tipo de medicamento para tratar a síndrome de Asperger. O que pode acontecer é o uso da medicação para sintomas como déficit de atenção, insônia, hiperatividade e outros que possam surgir.

ALUNAS. Como funciona o acompanhamento das famílias de portadores da síndrome de Asperger?
A.D. A escuta, o apoio e a parceria é o que vamos construindo na relação com essas famílias. A aceitação da criança pela família é fundamental para seu crescimento, para que possa estimulá-la, interagir com a criança sem peso, sem culpa. Às vezes, as famílias subestimam, achando que a criança não é capaz, que não vai dar conta. Então, não interagem, não estimulam, às vezes há um movimento de fuga. No primeiro momento, quando a família recebe o diagnóstico, tem uma negação muito grande, achando que ela só tem dificuldade com limite, que é mais imatura.

O importante é que a criança tenha o acompanhamento e o estímulo adequado ao seu ritmo, considerando que ela está em processo de desenvolvimento e que cada caso é único. Ela precisa contar com o apoio do “tripé”, que consiste em família, escola e acompanhamento profissional específico e mais do que isso, com pessoas que dêem afeto, que acreditem em seu potencial e em sua capacidade de desenvolvimento.

Para saber mais:
Site: Inspirados pelo autismo (Programa Sonrise)
http://www.inspiradospeloautismo.com.br/
Filme: Meu filho, meu mundo.

5 comentários:

  1. Esse foi um dos trabalhos mais prazerosos que já fiz! A Psicóloga Alice foi super acessível e tirou todas as nossas dúvidas. Conhecemos a síndrome de Asperger, aprendemos mais sobre o autismo e muito sobre a educação inclusiva, com essa pessoa muito humana, que trabalha com seres humanos e não com mercadorias! Com certeza virou um exemplo de profissional e pessoa em quem se espelhar!

    Espero que gostem e que seja tão rico para vocês como foi para nós.

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  2. Patrícia Fonseca

    Concordo com a Rebecca qndo ela diz que esse trabalho foi bastante prazeroso, pois a psicologa nos tirou algumas duvidas sobre a Sindrome de Asperger e sobre como a familia de uma criança portadora dessa sindrome a encara.Ela comentou sobre o importane papel do psicologo nessa aceitação da familia.
    Outro ponto que achei de grande importância nessa entrevista foi quando a psicologa nos disse que quando a escola recebe algum aluno de inclusão ela orienta as professoas a observaram a criança e não a sindrome que essa criança possui.
    Espero que esse trabalho possa tirar algumas duvidas sobre a Sindrome de Asperger e aguçar a vontade de pesquisar e aprender um pouco mais sobre ela.

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  3. Esta entrevista esclareceu e trouxe características essenciais para os pedagagos trabalharem não só com a SA, mas com as diferenças em geral, pois é preciso acreditar sempre que o educando deve ser respeitado no seu ritmo de aprendizagem e construção de conhecimento, numa atitude de solidariedade real e verdadeira.As pessoas constroem melhor os seus conhecimentos e a sua identidade em contacto com os outros.
    Desta forma a chave do sucesso é a construção de um canal de comunicação com todos os envolvidos
    Para que se possa construir uma sociedade inclusiva é preciso antes de qualquer coisa, de toda uma mudança no pensamento das pessoas e na estrutura da sociedade, isso requer certo tempo, mas o que irá realmente nortear e desencadear essas mudanças nas pessoas é em um primeiro momento a real aceitação das pessoas com necessidades especiais, essa aceitação deve começar pela própria família.
    Parabéns meninas excelente trabalho!!!

    Aurilene Pontes

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  4. Parabéns meninas foi uma excelente entrevista, que com certeza vai acrescentar muito ao nosso aprendizado.
    É interessante perceber as características da síndrome Asperger, onde não há um comprometimento tão grande quanto no autismo, e existe defasagem na simbologia maior. Mais o melhor da entrevista é quando é perguntado do diagnostico e da intervenção onde a psicóloga, demonstra claramente a preocupação com a pessoa, em atender as necessidades daquele aluno, onde o professor deve conhecer o seu aluno.

    bjs!!!!
    Lidiane

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  5. Parabéns pela entrevista,

    Até ler esta entrevista não tinha conhecimento dessa síndrome. Mas é fácil perceber que a solução sempre estará envolvida com o meio social. É inegável que nós (educadores) podemos contribuir para que ocorra essa interação, e assim contribuindo para o melhor desenvolvimento dessa criança, porém antes de tudo deixar a família ciente o quanto esta criança precisa saber que a família está envolvida, caso não, quadro dessa criança tende a regredir.

    Isabel Lima

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